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"Tio Leão XII se ocupou dos detalhes da operação como se fosse em sua própria carne. Tinha um interesse singular pelas dentaduras postiças, contraído numa de suas primeiras navegações pelo rio Madalena, e por culpa de sua dedicação maníaca ao bel canto. Numa noite de lua cheia, à altura do porto de Gamarra, apostou com um agrimensor alemão que era capaz de despertar as criaturas da selva cantando uma romança napolitana do passadiço do comandante. Por pouco não ganhou. Nas trevas do rio sentia-se o voejar das garças nos pântanos, o rabear dos jacarés, o pavor das savelhas procurando saltar em terra firme, mas na nota culminante, quando se receou que as artérias do cantor se fossem romper com a potência do canto, a dentadura postiça lhe saltou da boca com o alento final, e afundou nas águas.
"O navio teve que demorar três dias no porto de Tenerife, enquanto lhe faziam outra dentadura de emergência. Ficou perfeita. Mas na navegação de volta, tratando de explicar ao comandante como perdera a dentadura anterior, tio Leão XII aspirou a pleno pulmão o ar ardente da selva, deu a nota mais alta de que foi capaz, susteve-a até o último alento procurando espantar os jacarés deitados ao sol que contemplavam sem pestanejar a passagem do navio, e também a dentadura nova afundou na corrente. Desde então teve cópias de dentes por toda parte, em diferentes lugares da casa, na gaveta da escrivaninha, e uma em cada um dos três navios da empresa."
(O amor nos tempos do cólera. Gabriel García Márquez)
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